Mimi Tavares
(Portuguesa - 1962)Todos os dias - Desenhos
«Todos os dias», reúne um conjunto de desenhos realizado diariamente pela artista, desde o inicio de 2023 a meados de 2024, a que se juntaram outros, realizados já este ano de 2025.
Exercício auto-proposto de representação, assemelha-se a uma galeria de delicados e miniaturizados retratos aparentemente tirados polo natural, mas intencionalmente realizados pela observação mediada pela imagem fotográfica. Os núcleos apresentados na exposição, resgatam fragmentos de um quotidiano centrado na figura humana, corpos em acção, em repouso, que interagem pontualmente com objectos, com animais, connosco como espectadores, interpelando-nos, cativando-nos o olhar para lá do vazio em volta.
Numa vitrine dispõem-se o que a artista designa por “botões”: pequenos círculos de tinta acrílica, seca a partir da limpeza de boiões de tinta, que servem de base à pintura, também ela feita a acrílico, de pequenas figuras que nos observam, desse fundo em que nasceram.
Mas o momento fundamental para o desenvolvimento deste trabalho foi o achamento pela artista de um velho caderno de folhas coloridas. Atendendo ao valor plástico do próprio envelhecimento do material de suporte, à sua textura, ao modo como a luz foi modelando de variações a uniformidade cromática da superfície, Mimi Tavares utilizou como riscadores os materiais primevos do desenho - o carvão, a grafite, a sanguínea, os pastéis, mas também o giz ou os lápis de cor. Inscreveu figuras no vazio do papel, pequenos signos densos de significado que em si concentram a potência narrativa do conjunto.
Não são desenhos realizados directamente do real mas resgatam-no através de fotografia, e devolvem-no com a doçura do traço e do tamanho miniaturizado, fixando um momento no frémito da vida em curso. São retratos porque passiveis de serem reconhecidos mas são sobretudo agentes de ficção, de reflexão sobre o tempo e espoleta de desenho. A força está no que se constrói mas também no poder sugestivo da ausência, de tudo o que poderia caber na imagem, nessa amplitude da folha de papel. Porque não se vê para lá da figura? O que poderia estar? O que se nega? Ou o que se afirma na planimetria desse tudo possível, que está para lá de ?
Podemos pensar nas outras obras da artista. Nas pinturas povoadas de silêncios. Em como nos dão o inverso do que aqui se vê. Os espaços arquitectonicos vazios de gente, imobilizando vivências de pessoas que não vemos. Nas paisagens, o exterior surge com o mesmo esboço cenográfico e as figuras, se acaso surgem, pouco alento dão a essa referencia.
Aqui, a intenção de desenhar pessoas não se faz por qualquer apelo anatómico mas pela intimidade estabelecida com o que se cativa. Na escolha das imagens primeiro ( as fotografias de família, os rostos desconhecidos), e depois pelo exercício diário do traço, na representações das posturas, das micro-expressões, das roupas que denunciam contextos, pequenos enredos a que os títulos acrescentam sentido. Continuando a deixar tudo em aberto. Os dias à medida da mão e do desenho.
Expõe regularmente desde 1983, sendo representada pela Galeria Monumental, de Lisboa e pela Galeria Sete, de Coimbra. Tem desenvolvido trabalho de pintura e desenho, encontrando-se representada em várias colecções públicas e privadas, das quais se destacam a CACE, o MNAC, a CGD e a Fundação António Prates.
Veja o CV da artista aqui:
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Mimi Tavares
(Portuguese – 1962)Every day - Drawings
‘Every day’ brings together a set of drawings made daily by the artist from the beginning of 2023 to mid-2024, to which others have been added since 2025.
A self-proposed exercise in representation, it resembles a gallery of delicate, miniaturized portraits apparently taken from nature, but intentionally made through observation mediated by the photographic image. The sections presented in the exhibition take fragments of everyday life centered on the human figure, bodies in action, at rest, which interact occasionally with objects, animals, with us as spectators, questioning us, captivating our gaze beyond the emptiness around us.
In a glass case, what the artist calls ‘buttons’ are arranged: small circles of acrylic paint, dried by cleaning paint jars, which serve as a base for the painting, also done in acrylic, of small figures watching us from the background in which they were born.
But the key moment in the development of this work was when the artist found an old notebook with coloured sheets. Given the plastic value of the ageing of the support material itself, its texture, the way in which the light has shaped the chromatic uniformity of the surface in variations, Mimi Tavares used the primordial drawing materials - charcoal, graphite, sanguine, pastels, but also chalk or coloured pencils - as scratchers. He inscribed figures in the emptiness of the paper, small signs dense with meaning that in themselves concentrate the narrative power of the whole.
They are not drawings made directly from the real world, but they rescue it through photography, and give it back with the sweetness of the line and the miniaturized size, fixing a moment in the frenzy of life in progress. They are portraits because they are recognizable, but above all they are agents of fiction, reflections on time and drawing sparks. The strength lies in what is constructed, but also in the suggestive power of absence, of everything that could fit into the image, in that spaciousness of the sheet of paper. Why can't we see beyond the figure? What could be there? What is denied? Or what is affirmed in the planimetry of this possible everything, which is beyond ?
We can think of the artist's other works. The paintings full of silences. How they give us the opposite of what we see here. Architectural spaces empty of people, immobilizing the experiences of people we don't see. In the landscapes, the exterior appears with the same scenographic outline and the figures, if they appear at all, give little encouragement to this reference.
Here, the intention to draw people is not based on any anatomical appeal, but on the intimacy established with what is captivating. Firstly in the choice of images (family photographs, unfamiliar faces), and then through the daily exercise of drawing, in the representation of postures, micro-expressions, clothes that reveal contexts, small plots to which the titles add meaning. Still leaving everything open. The days of the hand and drawing.
She has exhibited regularly since 1983 and is represented by Galeria Monumental, in Lisbon and Galeria Sete in Coimbra. She has developed painting and drawing, and is represented in various public and private collections,
including CACE, MNAC, CGD and the António Prates Foundation.
See artist’s CV here.
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